terça-feira, 30 de abril de 2013

Tem dificuldade em falar? Escreva!!!


Vivemos tempos estranhos



A forma como a loucura e o louco são vistos mudou muito. Ainda não há muito tempo eram encarcerados, escondidos da sociedade como possuidores de uma doença altamente contagiosa, sendo sujeitos a maus tratos difíceis de imaginar. A dignidade humana não existia para o louco.

 Esse importante avanço civilizacional permitiu reconhecer ao louco direitos que até aí eram negados (em parte continuam a ser). Os avanços continuam em velocidade cruzeiro e ninguém pode, com alguma certeza, dizer até onde nos levarão.

O louco evoluiu para doente mental e rapidamente começou a banalizar-se a loucura vulgarizando e o que ela tem de mais presente, o sofrimento. Do rótulo incómodo passou-se ao alívio através do rótulo. Os loucos não sofrem, dizem-nos. Os loucos não precisam sofrer, vendem-nos. Os loucos não existem, mentem-nos.

Louco estou eu, cada vez mais


psicologia clínica


quarta-feira, 24 de abril de 2013

Diálogos, monólogos e solilóquios



VAI. E se der medo, vai mesmo com medo



Compulsão à repetição

Ao nível da psicopatologia concreta, processo incoercível e de origem inconsciente, pelo qual o indivíduo se coloca activamente em situações penosas, repetindo assim experiências antigas sem se recordar do protótipo e tendo pelo contrário a impressão muito viva de que se trata de algo de plenamente motivado na actualidade.

É de toda a evidência que a psicanálise viu-se confrontada desde a origem com fenómenos de repetição. Se encararmos nomeadamente os sintomas, por um lado alguns deles são manifestamente repetitivos (rituais obsessivos, por exemplo), e, por outro, o que define o sintoma em psicanálise é precisamente o facto de reproduzir, de maneira mais ou menos disfarçada, certos elementos de um conflito passado. De um modo geral, o recalcado procurar “retornar” ao presente, sobre a forma de sonhos, de sintomas, do agir: “o que permaneceu incompreendido retorna; como uma alma penada, não tem repouso até encontrar resolução e libertação”


Vocabulário da Psicanálise – J. Laplanche & J.B. Pontalis


psicologia clínica

terça-feira, 23 de abril de 2013

Therapy is...


Therapy isn’t about finding yourself
Therapy is about creating yourself
























Psicoterapia

No colo aprendi a amar

Num post anterior dei conta de um estudo da FPCE-UC onde se concluía que: “Brincar 10 minutos diários com os filhos em idade pré-escolar, sem direito a fazer mais nada em simultâneo, e de forma cooperativa, contribui para reduzir os distúrbios de comportamento, como p. ex., hiperatividade, défice de atenção, oposição (a criança opõe-se a qualquer ordem do adulto) e desafio e agressividade.”

Agora surge um estudo desenvolvido no Japão pelo Dr. Kumi Kuroda (Riken Brain Science Institute) com resultados, passe a ironia, absolutamente inesperados: os bebés acalmam quando são colocados no colo.

Durante décadas os pais foram bombardeados com dezenas de teorias estapafúrdias que ensinavam a cuidar dos filhos. Os especialistas na matéria, pediatras e psicólogos, venderam milhares de livros “revolucionando” a forma de educar. Técnicas para lidar com choros, birras etc., foram desenvolvidas com base em preconceitos (e muita ciência, sempre muita ciência) e, invariavelmente, descentrando-se do principal: “A criança”.

Resultado: os pais perderam a espontaneidade, a sua capacidade instintiva de cuidar (que passa de pais para filhos). Em vez de se desenvolver um vínculo seguro através do estabelecimento de uma boa relação - objectivo primeiro -, instrumentalizou-se a relação humana precoce. É um exagero dizer que os inúmeros diagnósticos de hiperactividade estão relacionados com este tipo de relação, até porque muitos desses diagnósticos estão errados, mas como a sabedoria popular nos ensina: “quem semeia ventos colhe tempestades”.

Nunca imaginei poder dizer que estes estudos são muito bem-vindos, nem imaginei sequer, que fossem desenvolvidos e que tivessem esta divulgação. Mas eles aí estão, para nos dizerem o que todos sabíamos.


psicologia clínica

sexta-feira, 19 de abril de 2013


How can you fix what you don’t understand?

Autorização para sofrer

Para quê sofrer se posso evitar?! Nem todas as pessoas que procuram a todo o custo não sofrer o fazem para evitar o sofrimento propriamente dito, a dor. Existem muitas pessoas para as quais o sofrimento está interdito. Essas são as que precisam de autorização para sofrer. Quando conseguimos fazer entender, por exemplo, que perante a perda/luto de alguém que se gostava muito é normal estar triste, perder o apetite ou não conseguir dormir e, estranho seria sair de um funeral directamente para o cinema ou para uma festa com um sorriso na cara, isso não cria nenhum tipo de estupefacção, todos compreendem facilmente que é normal estar em sofrimento, só faltava a permissão! O conhecimento latente de que sofrer é próprio à vida foi-se tornando cada vez mais uma realidade desajustada. O sofrimento e as suas causas não são muito diferentes do que sempre foram, mas a atitude, essa, parece cada vez menos humana. Os robots dos filmes de ficção científica sonham em ser humanos, nós, em ser robots.



Psicoterapia

terça-feira, 16 de abril de 2013

Abstinência, neutralidade ou insensibilidade?


“A insensibilidade do analista (maneira afectada de cumprimentar, exigência formal de “contar tudo”, a atenção dita flutuante que, afinal não o é e certamente não é apropriada para as comunicações dos analisandos, impregnadas que estão de sentimentos e frequentemente trazidas com grande dificuldades) tem por efeito: (1) o paciente sente-se ofendido pela falta ou pela insuficiência de interesse; (2) como ele não quer pensar mal de nós, nem nos considerar desfavoravelmente, procura a causa dessa não-reacção nele mesmo, ou seja, na qualidade daquilo que nos comunicou; (3) finalmente, duvida da realidade do conteúdo que antes estava tão próximo do sentimento.”

Entre os inúmeros exemplos sobre aspectos técnicos subjacentes à prática clínica, a escolha do primeiro parágrafo do Diário Clínico de Sándor Ferenczi (7 de Janeiro de 1932) prende-se com o facto de se tratar de um dos primeiros testemunhos sobre a “obrigatoriedade” de dar ao espaço terapêutico autenticidade. Como refere Kupermann “A noção de sensibilidade, oriunda do campo da estética, é empregue por Ferenczi no seu sentido rigoroso como a capacidade de afetar e de ser afetado pelo outro, e não no sentido coloquial, que poderia remeter-nos às ideias de plácida benevolência ou de compreensão ilimitada e passiva etc., que foram apressadamente associadas a sua figura. A insensibilidade ou a hipocrisia é, assim, a principal figura do álibi passível de ser empregue pelos analistas para escapar das duras consequências do acto analítico.”

Voltarei a este tema…. Sem dúvida!


Psicoterapia

Chover no molhado ou, nem por isso….

Numa fase em que parece que tudo tem que ser estudado, tem que ser comprovado para que as pessoas prestem alguma atenção e, quem sabe, as ponham em prática, acho bem que saiam estas notícias. Mas também devemos colocar a questão: Isto é realmente uma conclusão nova? Não sabíamos todos isto? Então desculpem que diga, se não sabiam deviam saber!

“Brincar 10 minutos diários com os filhos em idade pré-escolar, sem direito a fazer mais nada em simultâneo, e de forma cooperativa, contribui para reduzir os distúrbios de comportamento, como p. ex., hiperatividade, défice de atenção, oposição (a criança opõe-se a qualquer ordem do adulto) e desafio e agressividade, comprova um estudo da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra.”

O estudo foi efectuado com crianças com problemas de comportamento diagnosticados e, segundo os resultados, com sucesso, pois verificou-se uma redução de sintomatologias de hiperatividade, défice de atenção e oposição e desafio, agressividade e impulsividade.

Embora o estudo se tenha focado na intervenção em famílias de crianças com diagnóstico clínico, a investigadora defende que o programa é também essencial para atuar «ao nível da prevenção de futuros comportamentos desviantes. Todos os pais deveriam ter acesso gratuito ao programa nos centros de saúde, tal como têm acesso a vacinas, ou nos jardins-de-infância».

A investigadora Maria Filomena Gaspar defende que o programa é também essencial para actuar «ao nível da prevenção de futuros comportamentos desviantes”. Desculpem colocar outra questão: Se os pais brincassem mais com os filhos, colocassem regras e limites não se evitariam muitos diagnósticos clínicos?

Se forem precisos estudos para nos dizer que temos que brincar com os nossos filhos, estamos mal, estamos muito mal!


psicologia clínica

sexta-feira, 12 de abril de 2013

A Alma Humana


Ao contrário de Amour, de Michael Haneke, que parece ter-nos roubado a capacidade de transformar em palavras o que sentíamos pelo esmagamento da intensidade afectiva a que somos sujeitos, Jagten (A Caça) de Thomas Vinterberg (Dogma 95), obriga-nos a procurar palavras para verbalizar o insuportável desconforto de nos vermos espelhados na escuridão da alma humana. Não querendo entrar em grandes comparações, digo apenas que a Palma de Ouro ficaria MUITO melhor entregue ao filme de Vinterberg, que teve em Mads Mikkelsen o prémio de melhor actor.

Não me vou perder em elogios aos brilhantes actores que contracenam com o magistral Mikkelsen. Somente dizer que Annika Wedderkopp (Klara-criança) com o seu olhar doce e perdido faz-nos sentir que a sua fragilidade e desamparo só pode ser real.

Apesar da liberdade de cada um pensar que o filme trata desta ou daquela questão (também vou exercer a minha), o tema principal do filme, como o próprio Vinterberg referiu numa entrevista, não é a pedofilia, como seria fácil supor. Segundo o realizador a ideia para o filme foi-lhe apresentada por um psicólogo, e nela estavam as fantasias de abuso sexual criadas pelas crianças. Uma década depois, quando procurou fazer terapia, Vinterberg decidiu ligar ao mesmo psicólogo dizendo-lhe: “Para ser educado, decidi ler aquele material e fiquei chocado” com o elevado número de falsas acusações de pedofilia.

Para os que estão familiarizados com a Psicanálise o tema das fantasias de abuso sexual não são novas. Freud, nos seus trabalhos iniciais, desenvolveu a “Teoria da Sedução” onde, com base nas descrições dos seus pacientes e da sua auto-análise terá considerado que as crianças teriam sido sujeitas a seduções de cariz sexual por parte dos adultos, principalmente familiares. Perante alguns factos Freud viu-se forçado a abandonar as suas formulações acerca da cena de sedução e a substituir a crença na realidade desta cena pela suposição de que a sedução seria uma construção, em termos de fantasia, do próprio sujeito. Assim, a cena de sedução não possui correspondência na realidade externa – apesar de recorrer a alguns indícios dessa realidade – mas, trata-se de uma construção, uma “realidade psíquica”. Em 1897 numa carta a Fliess, Freud expressou a sua insatisfação com a teoria da sedução, afirmando ter deixado de acreditar na “neurótica”. (Para os interessados no tema, é importante referir que há nesta questão muitas nuances, que permitem várias leituras sobre o abandono da teoria de sedução).

Agora o filme

A Caça é um filme absolutamente claustrofóbico onde o espaço e o tempo (bomba relógio) se encolhem de forma pautada até ao intolerável. Como num terrível pesadelo, queremos gritar mas da nossa boca não sai nenhum som, ninguém nos pode ouvir, ou melhor, ninguém nos quer ouvir. Queremos fugir mas não podemos. Estamos destinados, como Lucas, a viver sem esbracejar. Estamos a ver tudo, sabemos tudo, e sofremos porque nós somos Lucas. Presos num magnetismo inexplicável assistimos colados na cadeira, com suores frios à mistura, a um filme pungente, devastador.

Este é um filme sobre o ser humano, um objecto de estudo, onde da pureza, da inocência e do horror na infância se passa para tormentos da adolescência e se termina numa despedaçada vida adulta. Todos estes tempos se cruzam e são interpretados por personagens diferentes. Vinterberg põe a nu a agressividade existente em todos nós e a forma fácil dela se fazer presente. Espicaçado na capacidade destruidora, o grupo (caçadores) encontra na presa (caça - Lucas) a satisfação do instinto destrutivo. Dirigido com uma crueza arrepiante, Vinterberg, põe a nu os aspectos sombrios da alma humana, seja criança, adolescente ou adulto. Sendo, neste caso, uma criança (as crianças gozam de um olhar particularmente distorcido por parte dos adultos), o sentimento é ainda mais aterrador.

Este filme deveria passar em todas as faculdades de Psicologia. Não faria mal nenhum a magistrados, e a todas a áreas do saber ligadas a esta problemática.


Mais que imperdível, indispensável




psicologia clínica

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Benefício primário e secundário da doença

Benefício da doença designa de um modo geral qualquer satisfação directa ou indirecta que um individuo retira da sua doença.
benefício primário é o que entra em consideração na própria motivação de uma neurose: satisfação encontrada no sintoma, fuga para a doença, modificação vantajosa das relações com o meio.
benefício secundário poderia distinguir-se do precedente do seguinte modo:
– pela sua aparição posterior, como vantagem suplementar ou utilização pelo indivíduo  de uma doença já constituída;
– pelo seu carácter extrínseco em relação ao determinismo inicial da doença e ao sentido dos sintomas;
– pelo faco de se tratar de satisfações narcísicas ou ligadas à auto-conservação, em vez de satisfações directamente libidinais.
O “benefício primário” está ligado ao próprio determinismo dos sintomas.
Podemos distinguir duas partes:
– A “parte interna do benefício primário” consiste na redução de tensão proporcionada pelo sintoma; este, por doloroso que seja, tem por fim evitar ao indivíduo conflitos às vezes mais penosos: é o chamado mecanismo de “fuga para a doença”.
– A “parte externa do benefício primário” estaria ligada às modificações introduzidas pelo sintoma nas relações interpessoais do indivíduo.
Assim, uma mulher oprimida pelo marido pode obter, graças à neurose, mais ternura e atenção, vingando-se ao mesmo tempo dos maus tratos sofridos. Mas se Freud designa este último aspecto de benefício pelos termos “externo ou acidental”, é exactamente porque a fronteira que o separa do benefício secundário é difícil de traçar.
Para descrever este, Freud refere-se ao caso da neurose traumática, e mesmo ao de uma invalidez física resultante de um acidente. O benefício secundário materializa-se aqui pela pensão paga ao inválido, poderoso motivo que se opõe a uma readaptação: “ Ao contrário da sua enfermidade, começaríamos por lhe retirar os seus meios de subsistência, uma vez que, ele não seria capaz de retomar o seu antigo trabalho”.
Vocabulário da Psicanálise – J. Laplanche & J.B. Pontalis


psicologia clínica

terça-feira, 9 de abril de 2013

Os textos que eu não escrevi


Você tem cabeça aberta?

Você tem cabeça aberta? Acusar alguém de ter cabeça fechada hoje em dia é uma ofensa pior do que xingar a mãe.

Hoje todos querem ter cabeça aberta. Um tema top para cabeças abertas é preconceito x práticas sexuais, e um lugar certo para deixar claro que você tem cabeça aberta é jantares inteligentes. Se você quer fazer sucesso num jantar desses, chame todo mundo que discorda de você de "ridícula".

Nesses jantares, as pessoas têm as opiniões certas sobre tudo; por exemplo, ninguém tem preconceito contra nada. Acho muito fofo gente que não tem nenhum preconceito contra nada.

No tema "práticas sexuais", o que percebemos, se formos um pouquinho além do senso comum, é que o "normal x patológico" ou "moral x imoral" é bastante relativo no tempo e no espaço. Isso significa que o que se acha imoral hoje amanhã pode não ser, e vice-versa. O mesmo para o que se acha patológico.

Quem busca um critério absoluto, sem variação histórica ou geográfica (a tal variação no tempo e no espaço de que falei acima), hoje em dia, se vê em maus lençóis. Além, claro, de dar atestado de ter preconceitos numa época em que ter preconceitos é pior do que matar a mãe.

Aliás, se não disse ainda, digo: acho fofo gente que não tem preconceito contra nada.

Um modo de se posicionar acerca dessa fronteira entre sexo normal x patológico ou moral x imoral é defender a ideia de que entre dois adultos tudo é permitido, se a prática for fruto de livre escolha (eis uma versão para mortais da tal autonomia kantiana).

Esse argumento até é válido, já que não sabemos mais nada sobre coisa nenhuma em moral (só mentirosos dizem que têm "princípios éticos"). Mas ele é problemático, já na definição de "adulto", porque ela também é relativa no tempo e no espaço. Um cara de 40 ficar com uma mina de 14 nem sempre foi visto como crime contra a infância.

Outra coisa problemática é a própria ideia de "livre escolha". Por exemplo, se você gosta de apanhar, talvez só goste mesmo quando seu parceiro ou parceira vai além do que você "permite", senão você não goza de verdade. Mas devo confessar que há algo de pueril em achar que "livre escolha" resolva o problema. Acreditar na ideia de "autonomia kantiana" (a tal da "livre escolha"), às vezes, também, é superfofo.

Vamos, porém, deixar de barato esses pequeníssimos detalhes e vamos a algo mais "significativo".

Faço uma proposta para seu próximo jantar inteligente. Claro, se você for um pobre engenheiro, nem pense em querer ir, a menos que sua mulher seja psicóloga --aí os donos da casa inteligente podem aceitá-lo. Se você for um cara e sua "mulher psi" for um cara também, aí a entrada é garantida.

Vamos testar as cabecinhas abertas? Atenção, respire fundo: você já viu o vídeo "2 girls 1 cup"? Mas, antes de descrevê-lo (não em detalhes, porque seria demais para uma segunda-feira), vou dizer uma coisa.

Acho que, se você é o tipo de pessoa que quer provar que tem cabeça aberta, você deve discutir apenas o que lhe parece absurdo (ou "nojento", na linguagem de gente que tem preconceito). Mas não é isso o que acontece normalmente.

A moçadinha que tem cabeça aberta só gosta de discutir coisa que não põe em risco sua imagem de gente bacana. Falar mal de machista, racista, sexista, católico e evangélico é coisa de iniciante no ramo de discussões de verdade.

E o vídeo? Neste, duas mulheres começam com sexo lésbico normal e acabam fazendo sexo a três: elas duas + as fezes de uma delas (se é apenas efeito especial, pouco importa). Isso é chamado no mundo careta de "coprofilia". Quem gosta de xixi é urofílico.

Então: gente que gosta disso é doente, imoral, ou apenas gente de cabeça aberta explorando seus limites do gozo? Lembre: o que hoje é doença ou imoralidade amanhã pode não ser.

Na verdade, imagino que em breve esses caras terão suas ONGs e defenderão também "safe sex". Como fazê-lo? Ensinando nas escolas a identificar fezes infectadas pela aparência e cheiro?

O que a gente fofa diria disso? Ainda sem preconceito? Perdeu o apetite? As ciências sexuais têm muito o que aprender.


Luiz Filipe Pondé – Folha de S. Paulo



psicologia clínica

quinta-feira, 4 de abril de 2013

Diálogos, monólogos e solilóquios



Pills can’t fix a broken heart



Psicoterapia

O que está a mudar?!


Como terapeuta sou procurado por pessoas que se encontram num sofrimento agudo, mas também sou contactado por muitas que não estão satisfeitas com a forma como vivem. Pessoas que aparentando ter condições para ter uma vida mais preenchida não conseguem usufruir das relações afectivas, do estatuto profissional conquistado ou da situação financeira desafogada. Essas pessoas procuram na terapia ajuda para compreender o seu mal-estar, o que está “errado” com elas.

Outros procuram na terapia uma forma rápida de livrar-se do mal-estar. Numa versão fast therapy, não há nada para interrogar nem nada para compreender. Desejam apenas libertar-se com a maior rapidez e de preferência, sem esforço, daquilo que as faz sofrer.

Bastam cinco minutos para enumerarmos várias contrariedades, receios e angústias que ultrapassámos. Coisas que precisaram de tempo. Coisas que fazem da vida, aquilo que ela é, e, de nós, aquilo que somos.

O meu pai guardava com algum zelo uma bola de futebol que trazia da sua adolescência, até que um dia, muito menos zeloso, entre chutos e cabeçadas, cheguei a casa sem ela. Não me disse grande coisa, mas a tristeza nos olhos dele perdurou em mim uma eternidade. A culpa desmesurada que sentia ultrapassava a dimensão que uma criança deve sentir numa situação daquelas. As crianças perdem muitas coisas porque o seu pensamento não se foca facilmente numa única actividade. Provavelmente, a culpa não vinha só da perda da bola, mas era a parte mais visível.

Quando pensamos a culpa ela dá lugar à tristeza, e essa, mais facilmente ultrapassada. Em vez de objectos cheios de arestas pontiagudas a habitarem o nosso interior é preferível objectos arredondados e macios, mas também consistentes, a moldar o nosso Eu. Quando deixamos de nos interrogar estamos a paralisar o processo contínuo de transformações, a perder a oportunidade de retocar aspectos da nossa ininterrupta construção.


A ideia da solução rápida e fácil que tomou conta do nosso tempo só consegue ser superada por uma ainda pior: “tudo tem solução”. Não, não é verdade, há coisas que não têm solução. Aquela bola não volta mais, mas poder olhar para o meu pai sem me sentir culpado, poder jogar com ele com outra bola, que não substitui a antiga, mas que está investida do mesmo afecto, mostra que é desnecessário procurar alterar a realidade mas é fundamental deixar que a realidade nos mude na nossa subjectividadade.


Psicoterapia