terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

A tirania do espírito positivo


Ao ler um artigo no jornal Público – “Cancro:afinal, é permitido chorar”, deparei-me com a expressão: “a tirania do espírito positivo”.
Arregalei os olhos, e disse “Finalmente!”
Para bem de todos, mas principalmente para os doentes que se encontram num enorme sofrimento, desmonta-se a ideia de que o espírito positivo é uma panaceia.
É muito provável que os primeiros (naturais e compreensíveis) sentimentos após um diagnóstico de cancro, sejam de medo, de injustiça, de revolta, de raiva; “Porquê a mim?” Não muito distante destes deve andar a tristeza.
Pode ser que esteja enganado, que esteja só a falar por mim. Pode ser que eu seja um pessimista e por isso não consiga ver o sol a brilhar quando inesperadamente se abre uma janela para a escuridão.
É muito importante reconfortar alguém que está num grande sofrimento, que além do mais, também nos toca profundamente. Mas se conseguirmos resistir às frases feitas e der-mos espaço ao outro para lidar com a sua dor, marcarmos a nossa presença e disponibilidade, então, estamos a ser uma verdadeira ajuda.
Se já reconfortou alguém, usando alguma frase feita, não se preocupe, ainda não é considerado um “tirano do espírito positivo”. Para ser um verdadeiro “tirano”, precisa fazer sentir ao outro que esses sentimentos são maus, que lhe fazem mal, e se não os tivesse, provavelmente, a sua vida seria muito melhor.
“A tirania do espírito positivo”, que se tenta eliminar na oncologia está profundamente enraizada e tem ferozes defensores. Ela encontrará mais seguidores junto dos que estão impossibilitados de ser honestos com o que estão a sentir.
O nosso papel é ajudar o outro a construir uma narrativa sobre a dor, e dessa forma libertá-lo da tirania do espírito positivo.
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psicologia clínica

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