Sei, hoje,
exactamente aquilo que falhei:
não senti a dor
até ao fim. Fugi
antes que ela se
tornasse coisa nenhuma
e fosse já nada
diferente de mim, do que sou
antes, depois,
durante as coisas sensíveis
tangíveis,
tacteadas, apalpadas na escuridão
dos anos.
Sem luz nem cor
nem beleza possível
de julgar.
E, súbito, tudo
são corpos a cair contra corpos
imaginar é o dom
que lhes foi dado.
imaginar a
beleza e a fealdade, o longe e o
perto que se
está de cada coisa.
Nenhuma vitória
me ensinará mais que um naufrágio
nenhuma vida é
mais vida por ter mais risos que palhaços
menos esperas
que encontros.
A vida eterna
não promete o sol nem o calor nem a riqueza nem
abraços. Os
livros
falam da paz. E
da paz só. A paz apenas prometem, por isso
sei, hoje, o que
sonhar para a morte.
Subo e desço das
camas, das cadeiras, dos lugares
agarro-me ao que
acaba como se o mar me fosse engolir depois
enquanto as
trevas rodam em torno da terra e
deixam
intervalos de luz,
corro contra as
horas
para não chegar
tarde, para não ser esquecido
para não me
mentir
mas o que
importa é subir e descer, manter-se
à superfície de
si mesmo, não interessa em que mar
as camas, as
cadeiras, os lugares, os corpos sem cor
continuarão
antes depois durante os intervalos de luz
e só eu poderei
responder à morte
a que preço está
a vida eterna,
em quantos anos
pagarei
os juros do
empréstimo
com que comprei
a paz.
Alexandre Borges
– Heartbreak Hotel
Psicoterapia
Sem comentários:
Enviar um comentário