Como já é hábito aqui no blog,
Eliane Brum com mais uma das suas excelentes crónicas: Acordei doente mental
"Descobri que sou doente
mental ao conhecer apenas algumas das novas modalidades, que tem sido
apresentadas pela imprensa internacional. Tenho quase todas. “Distúrbio de
Hoarding”. Tenho. Caracteriza-se pela dificuldade persistente de se desfazer de
objetos ou de “lixo”, independentemente de seu valor real. Sou assolada por uma
enorme dificuldade de botar coisas fora, de bloquinhos de entrevistas dos anos
90 a sapatos imprestáveis para o uso, o que resulta em acúmulos de caixas pelo
apartamento. Remédio pra mim. “Transtorno Disfórico Pré-Menstrual”, que
consiste numa TPM mais severa. Culpada. Qualquer um que convive comigo está
agora autorizado a me chamar de louca nas duas semanas anteriores à
menstruação. Remédio pra mim. “Transtorno de Compulsão Alimentar Periódica”. A
pessoa devora quantidades “excessivas” de comida num período delimitado de até
duas horas, pelo menos uma vez por semana, durante três meses ou mais. Certeza
que tenho. Bastaria me ver comendo feijão, quando chego a cinco ou seis pratos
fundo fácil. Mas, para não ter dúvida, devoro de uma a duas latas de leite
condensado por semana, em menos de duas horas, há décadas, enquanto leio um
livro igualmente delicioso, num ritual que eu chamava de “momento de felicidade
absoluta”, mas que, de fato, agora eu sei, é uma doença mental. Em vez de leite
condensado, remédio pra mim. Identifiquei outras anomalias, mas fiquemos neste
parágrafo gigante, para que os transtornos psiquiátricos que me afetam não
ocupem o texto inteiro."
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